Há um livro bem interessante chamado Como ler livros – O guia clássico para a leitura inteligente. Sua primeira edição é de 1940 e a segunda de 1972. Em seu primeiro capítulo podemos ler o seguinte:
Talvez hoje saibamos mais sobre o mundo do que no passado. Dado que o conhecimento é pré-requisito para o entendimento, trata-se de algo bom. Mas o conhecimento não é um pré-requisito tão importante ao entendimento quanto normalmente se supõe. Não precisamos saber tudo sobre uma determinada coisa para entendê-la. Uma montanha de fatos pode provocar o efeito contrário, isto é, pode servir de obstáculo ao entendimento. Há uma sensação, hoje em dia, de que temos acesso a muitos fatos, mas não necessariamente ao entendimento desses fatos.
Uma das causas dessa situação é que a própria mídia é projetada para tornar o pensamento algo desnecessário – embora, é claro, isso seja apenas mera impressão. O ato de empacotar ideias e opiniões intelectuais é uma atividade à qual algumas das mentes mais brilhantes se dedicam com grande diligência. O telespectador, o ouvinte, o leitor de revistas – todos eles se defrontam com um amálgma de elementos complexos, desde discursos retóricos minuciosamente planejados até dados estatísticos cuidadosamente selecionados, cujo objetivo é facilitar o ato de “formar opinião” das pessoas com esforço e dificuldade mínimos. Por vezes, no entanto, o empacotamento é feito de maneira tão eficiente, tão condensada, que o telespectador, o ouvinte ou o leitor não conseguem formar sua opinião. Em vez disso, a opinião empacotada é introjetada em sua mente mais ou menos como uma gravação é inserida no aparelho de som. No momento apropriado, aperta-se o play e a opinião é “tocada”. Eles reproduzem a opinião sem terem pensado a respeito.
Respeitando os quase 50 anos desta edição, d´écadas antes da internet e das redes sociais, o texto parece atualíssimo. Com a ressalva de que houveram algumas mudanças na forma como a informação chega até nós pelo mundo digital. Cargueiros carregados de containers com informações sem o devido aprofundamento para, ao menos, nos permitir entender o que está sendo dito, e opiniões oferecidas aos tubos para que todo mundo possa dar um veredito sobre assuntos sobre os quais não fazem a menor ideia. Foi-se o pensar, temos a ideia empacotada, como disseram Adler e Van Doren, autores do livro citado acima.
O resultado disso tudo é que cada vez vemos menos interesse no pensar, no refletir, no questionar. Acata-se tudo e pronto. Até porque tudo é vendido pronto. Ou entregue pronto, para “facilitar nossas vidas”.
No campo da educação em saúde e bem estar, é perceptível um grande número de alunos que não querem pensar. Querem apenas executar. Querem receita de bolo. De preferência alguma que possa ser aplicada a todos os tipos de problemas, para não ter que pensar em mais de uma. Ou então se permitem serem catequizados por ideias ilusórias ou por conteúdos com viés de marcas.
Querem saber como os profissionais no qual se espelham trabalham, para fazerem igual. Mas nem sempre querem saber porque aqueles a quem seguem fazem seus trabalhos da maneira que fazem. Deixando de lado o fato de que há método na forma de pensar e executar o trabalho. A propósito, a excelência profissional não está no trabalho em si, mas na forma de pensar e de executar o trabalho.
Estando na área da educação há anos, vejo que este comportamento é cada vez mais presente. Numa época em que a educação horizontalizou, ficando acessível a todo mundo, um legado incrível do universo digital, é interessante perceber que há uma certa falta de “energia” que conduza estudantes e profissionais e buscarem cada vez mais, e a pensarem de forma crítica suas condutas e suas práticas.
Ruim para quem quer tudo pronto, excelente para aqueles que entenderam que precisam sempre se posicionar cada vez mais acima do que estão. Porque nossos propósitos na vida devem ser sempre mais altos, mais longes e melhores.