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TRATAMENTO COM CORTICOIDES: benefícios e riscos, você os conhece?

Era um belo domingo de
sol quando almoçávamos todos na casa dos meus avós. Eu, como farmacêutica,
sempre curiosa por saber o que eles estão tomando de medicação. Eles, por outro
lado, felizes por saberem que mais alguém, no caso a neta, olha aquele monte
de caixinhas que têm de comprar todo mês para tentar driblar os problemas de
saúde que vem com a idade. Foi quando meu avô reclamou da pele do corpo. Estava
avermelhada, muito fina (o que é de se esperar para um senhor no alto dos seus
90 anos) e que por qualquer mínimo atrito ficava roxa. Só então trouxe do
quarto um pequeno (!) pote de 500 g de creme que há cerca de 10 ANOS passa no
corpo inteiro, após o banho. Meu susto foi quando li a fórmula… um creme contendo um corticoide.
Por que o susto? É o que vamos entender com o texto de hoje.
Os corticoides ou
corticosteroides são substâncias com propriedade antinflamatória,
 imunossupressora (diminui a resposta
imunológica), antimitótica (diminui os processos de divisão e diferenciação
celular) e vasoconstritora (capaz de contrair os vasos, diminuindo o seu
calibre) que foram inicialmente utilizadas em meados de 1950 para o tratamento
de artrite reumatoide. As primeiras moléculas disponibilizadas foram a
cortisona e a hidrocortisona, respectivamente, mas atualmente moléculas muito mais potentes estão disponíveis nas farmácias e drogarias. São medicamentos que podem ser
administrados por diversas vias, como a tópica, oral, intralesional, endovenosa,
pulmonar. Para a dermatologia, são verdadeiras “joias raras” por serem úteis e
efetivas em diversas afecções cutâneas, especialmente as inflamatórias e
autoimunes, incluindo alterações da saúde capilar e do couro cabeludo, como alopecia
areata, psoríase, dermatites, alopecia fibrosante frontal, líquen plano pilar,
entre outras.
No entanto, tratando-se
de corticoides, assim como qualquer outro medicamento, nem tudo são flores. Seus
efeitos colaterais são muitos e estão relacionados à dose e à potência do
corticoide. Lendo uma revisão sobre o tema, o autor fala que o mal uso destes
medicamentos resultou em um fenômeno denominado “corticofobia” (o medo do uso
de corticoides) tanto nos pacientes quanto em alguns prescritores. A ocorrência
de efeitos colaterais também está relacionada à forma como o medicamento é administrado
pelo paciente (via de administração). Pensando nas maneiras como podem ser
administrados, certamente a aplicação tópica é a que oferece menos chances de
efeitos colaterais.
O efeito mais almejado
quando da indicação de corticoides é a ação antinflamatória. Um vez que a inflamação
é uma resposta a reações imunológicas, um tratamento capaz de reduzir a
resposta imune é consequentemente capaz de reduz a inflamação. No entanto,
diminuindo a resposta imune diminui também a capacidade de defesa do organismo contra
agentes estranhos e possíveis contaminantes, como fungos e bactérias, deixando
aquele local (no caso de tratamento tópico) mais susceptível.
A aplicação
tópica (sobre a pele) é a via mais empregada na corticoterapia. Ao mesmo tempo
em que a pele atua como uma barreira eficiente contra a entrada de substâncias
nas camadas mais profundas, sabe-se também que dependendo das características da
molécula aplicada, da sua concentração, das características da formulação, da
condição da pele, entre outros tantos fatores, é possível que ocorra absorção
(chegada do fármaco até a corrente sanguínea) após a aplicação do medicamento
na superfície da pele. Se o tratamento for longo (por necessidade e com
prescrição médica ou por uso inadequado, como no caso do meu avô) e as áreas de
aplicação extensas, há chances de que a absorção seja suficiente para gerar
efeitos colaterais sistêmicos (no organismo como um todo). Quais seriam estes
efeitos colaterais? desbalanço eletrolítico, hipertensão, diabetes, retardo no
crescimento e síndrome de Cushing (rosto em formato de lua cheia, giba dorsal – aquele “calombinho” logo abaixo do pescoço, estrias, ganho de peso com acúmulo de gordura no centro do corpo, redução da tolerância a carboidratos, fragilidade vascular, pele fina, alterações oculares, fraqueza muscular, hipertensão arterial, osteoporose, maior susceptibilidade a infecções e alterações psiquiátricas), para citar alguns. 
         Engana-se
quem pensa que os efeitos colaterais podem surgir apenas se o corticoide chegar
até a corrente sanguínea. Existem efeitos colaterais locais que podem surgir a
partir da aplicação tópica. O principal é a atrofia da pele, que fica muito
fina, com perda da elasticidade e aparência envelhecida. Por ficar tão fina, a
pele pode ser machucada (cortada, ferida) com mais facilidade, bem como
apresentar hematomas, equimoses (manchas arroxeadas) e púrpura (pontinhos
arroxeados). Além disso, estrias, ulcerações (feridas), dificuldade na cicatrização de feridas,
dermatite de contato alérgica, mascaramento de alterações de pele, hipertricose
(aumento da espessura, tamanho e coloração de pelos, especialmente se o
tratamento é feito no rosto de mulheres), erupções com aspecto de acne e
aumento no número de pequenos vasos sanguíneos (telangectasias) podem ocorrer.
Farmacologicamente falando, há ainda a possibilidade de taquifilaxia (resistência clínica ao tratamento após aplicação prolongada e ininterrupta do medicamento) e efeito
rebote após a supressão do tratamento, especialmente se for de forma
brusca.
Por isso, parafraseio aqui Faiçal (1998): “…sempre ao introduzir esses
medicamentos (os corticoides), devemos ter em mente os seguintes princípios: utilizá-los o menor tempo possível”. Na
existência de outras alternativas terapêuticas menos deletérias, estas opções devem ser seriamente consideradas. Sobre isso, conversaremos em um próximo texto.
O que fica de informação para você, leitor, pensando na prática. Não tenha medo de usar o medicamento
contendo corticoide que o seu médico prescreveu. No entanto, USE-O CONFORME A ORIENTAÇÃO  MÉDICA E APENAS DURANTE O TEMPO RECOMENDADO. Esqueça a dica da vizinha ou a recomendação dos doutores do google que misturam tudo com mais um pouco e indicam medicamentos sem ter o conhecimento necessário para tal. NÃO SE AUTOMEDIQUE. Do contrário, esta terapia pode mais atrapalhar do que ajudar no curso da
alteração que você procura resolver.
Sobre o meu avô,
interrompemos o uso do produto contendo corticoide (pois ele não tinha
necessidade e já sofria com efeitos colaterais) e iniciamos um novo creme rico
em ativos cosméticos capazes de atrair e reter a água na pele, antioxidantes e
regeneradores. Resultado, menos de 2 meses depois: uma pele muito menos
avermelhada e praticamente ausência de equimoses e púrpura (os “roxos” dos
quais ele reclamava). No entanto, surgiu uma “coceirinha”, que certamente era
abrandada pelo creme anterior. Trabalhando melhor esta fórmula, não
precisaremos inserir novamente a corticoterapia em um creme que tem finalidade
hidratante para ser aplicado diariamente em todo o corpo do vovô. 
Fontes de consulta: 
– Faiçal S, Uehara MH. Efeitos sistêmicos e síndrome de retirada em tomadores crônicos de corticosteróides. Rev Ass Med Brasil 1988; 44:69-74.
– Anigbogu AN, Maibach HI. Topical corticosteroid therapy. In: Millikan, LE (Ed). Drug therapy in Dermatology. New York: Marcel Dekker. 2000. p. 1-29.
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