Tenho visto algumas coisas um tanto quanto paradoxais no mercado da Terapia Capilar. Quando um profissional resolve trabalhar com essa área ele tem de entender que caminho ele vai seguir. Se o caminho da saúde ou o da beleza. Eventualmente o caminho da saúde pode diminuir o impacto visual ou sensorial dos resultados pautados em modismos. Já no caso de quem opta pela beleza imediata em detrimento da saúde, poderá, em um primeiro momento, ter pacientes com cabelos bonitos mas que se tornam menos saudáveis, assim como com comprometimento da saúde do couro cabeludo.
Já ouvi pessoas falarem que demonizo o uso de determinados ingredientes para modificação da fibra. Achei o termo “demonizar” muito forte. Quem sabe porque vejo alguns produtos como parte de um mercado que eu chamo de pseudoterapêutico. O que é o mercado pseudoterêutico? É aquele em que produtos “lobos” estão disfarçados na pele de cordeiros. Ou seja o marketing é bonito, o apelo é legal, mas o produto traz consigo um certo risco que não fica claro ao profissional e ao cliente. Tenho medo disso pela saúde de quem usa. Mas entre ter medo dos riscos e demonizar há uma distância incrível. A mesma que existe entre o pneumologista e o consumo de cigarro. Ele pode dizer a seus pacientes que não é bom utilizar, mas não significa que sua opinião, totalmente voltada para a preservação da saúde, será acatada por quem fuma, o que é uma grande pena.
O que eu faço, na verdade, é contra indicar e me opor ao uso deles por meus pacientes e sugerir o mesmo aos profissionais que acabam tendo a mim como fonte de informação. Também é natural que, como pessoa pública e profissional da saúde eu me expresse da forma que creio ser mais coerente para orientar quem me segue ou me lê nas minhas redes sociais.
A verdade é que existe sim produtos que deixam os cabelos bonitos por fora mas danificados e mais sensíveis em sua estrutura. E, apesar de alguns desses produtos serem até liberados pra o uso pela ANVISA, o próprio material de divulgação de certos ativos presentes neles é claro em dizer que podem provocar danos no couro cabeludo. O exemplo aqui é sobre escovas ácidas que são incompatíveis com a maioria das demais químicas capilares, uma vez que a maioria dos métodos químicos trabalha numa faixa de pH que é bem diferente da que trabalham as escovas ácidas. Ou seja, a associação de métodos de transformação capilar com pHs tão diferentes pode ser desastrosa para os cabelos.
O bom profissional de terapia capilar, aquele que é responsável, evita seguir modismos de beleza em detrimento da saúde dos cabelos e do couro cabeludo. Se ele for bom mesmo, coerente com o que faz e com o que deve fazer para a saúde de seus clientes, agirá como o grande artista Michelangelo fazia ao tirar a beleza das pedras que usava para esculpir. Acreditava que a beleza já existia no interior das pedras, apenas usava seus instrumentos para trazê-la a tona. E assim um bom terapeuta capilar faz com os cabelos de seus clientes. Ele busca a beleza a partir da saúde. Tendências de moda? Apenas se não forem comprometer os fios e o couro cabeludo. O cabelo de todo mundo tem sua beleza natural, basta sabermos dar a ele os cuidados adequados que a beleza há de emergir.
Bem, já disse, não sou partidário de escovas ácidas. Tenho meus motivos. Há quem pense o contrário, que gosta, indica e usa. Cada um tem seu modo de pensar. Mas, nesse caso em especial, tenho uma grande documentação de pacientes com de lesões de couro cabeludo provocadas por esse tipo de processamento químico, assim como, volto a repetir, sei que ele trabalha em um padrão de pH que incompatibiliza com outras químicas capilares, causando danos irreparáveis às fibras. E esses dados não são exclusivamente meus. Profissionais de algumas empresas sérias de testes clínicos com quem tenho contato também colhem dados importantes sobre o risco desses produtos.
De alguma maneira, não creio que deva impedir ninguém de fazer nada, mas sim orientar naquilo que penso ser o mais adequado para a boa saúde dos meus pacientes e dos profissionais que levam minha opinião em conta. Entendo que esse é um dos principais conflitos que vejo na conduta de alguns terapeutas. Dizem tratar os cabelos mas ao mesmo tempo apelam para produtos que causam danos ao couro e á fibra. Há outros conflitos, pretendo falar sobre eles aqui. Mas sempre acreditei que este seria um bom tema para iniciar uma possível série de textos falando sobre conflitos em terapia capilar.