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É SILÊNCIO QUE FALA? HISTÓRIAS DE PACIENTES QUE PERDEM CABELOS SÃO MUITO MAIS COMPLEXAS DO QUE PARECEM

Eventualmente recebo e-mails ou mensagens de Whatsapp que chegam pelos contatos das clínicas onde trabalho (São Paulo e Rio Grande do Sul) de pessoas que agendaram ou que querem agendar consulta. 
Não tenho muito o hábito de me adiantar à consulta lendo esses materiais. Eventualmente abro quando junto com o paciente ou quando ele me conta em consulta que havia sido um dos que me escreveram. Essa conduta, de não ler antes, tem um propósito. Buscar de forma espontânea o que acaba sendo interessante sobre cada caso. Além de tirar de minha frente o viés exclusivamente capilar que a grande maioria dos pacientes chega para consulta. Quando falo em viés capilar, estou querendo dizer que tenho interesse em entender mais do que aquilo que ele tem para me contar sobre seu cabelo. Isso porque acredito que a saúde dos cabelos passa pela saúde do corpo e de nossas emoções, então, aquilo que o paciente pode não ter dado valor em um relato escrito pode ter grande valor quando conversado em consulta. 
O material enviado pelo paciente normalmente vira conteúdo de minhas informações sobre ele. Vai para sua ficha médica para ser estudado. O que quero dizer com “ser estudado”? Tento fazer uma mescla entre o que foi contado e o que me foi enviado por escrito e tentar tirar daí algumas conclusões que são essenciais para uma leitura mais ampla do que o aflige. É por isso que sou contrário às fichas de anamneses e a anamneses extremamente dirigidas. Elas costumam deixar de lado elementos que são chave para o bom entendimento de cada caso. Quem está há muito tempo no mercado, quem tem a veia clínica, quem gosta de ser um “Sherlock Holmes” da prática médica, certamente vai entender o que eu estou falando. Por isso, não vejo a minha prática clínica de uma forma tão simplista quanto observo na formação de profissionais atualmente. O que vale saber tudo sobre o problema de cabelo se você não sabe nada sobre o paciente? O que vale pesquisar tudo sobre o cabelo se não se sabe quem é o ser humano que está ali sofrendo?
Cada relato, e mesmo o conteúdo de cada consulta, mostra um caminho a ser seguido. Se o paciente for daqueles que compreende que o processo de cuidados com os cabelos é algo dinâmico e não estático, que já percebeu que os cabelos são sensíveis a certas mudanças no nosso dia a dia, sejam elas pequenas, médias ou grandes, e que os fios sofrem de acordo com essas mudanças com mais ou menos intensidade de acordo com o momento de cada um, melhor ainda. Toda situação vivida pelo paciente pode contar um segredo sobre nossos cabelos. Cabe a nós sabermos ler. Quando o profissional, e mesmo o paciente, escolhe não olhar para isso, perde-se muito. No meu caso, sei que para isso o paciente tem que estar sintonizado com a minha conduta e com aquilo que eu valorizo durante o seu tratamento, e, naturalmente, vice-versa.
Para atingir esse nível, o paciente precisa ser educado sempre. Quando falo sobre ser educado, quero dizer que tem de receber certo conteúdo informativo (leituras ou na forma de bate papo mesmo), do profissional que coordena seu tratamento assim como da equipe que participa de seus cuidados na clínica. Equipe esta que precisa ser bem preparada e também estar sintonizada sobre o contexto do problema do paciente. 
A verdade é que os pacientes de tricologia vivem intensamente o problema dos cabelos. Só quem experimenta (vive) um problema capilar, sabe o impacto que uma perda capilar pode ter. Por isso sou contra modelos reducionistas de tratamento, protocolos engessados e equipes que têm rigidez de conduta. Busco pensar maior. Pensar além do cabelo. Só assim posso ajudar quem vive a perda capilar e todo o elemento dramático que ela traz consigo. 
Sobre os relatos, prefiro aqueles que me chegam pessoalmente, a cada consulta, quando posso olhar para o paciente e perceber em sua fala e na sua conduta não apenas aquilo que ele diz, mas também o que ele demonstra sobre sua perda capilar. Esses não são escritos. São, na verdade, mesclados com entonações, sentimentos (que nenhum texto consegue expressar com a real magnitude), e silêncios. Ah, os silêncios. Esses também falam. 
Para os que gostam de música, em especial música clássica, tentem sentir o que diz o silêncio na composição Tabula Rasa Movimento 1 do Compositor Estoniano Arvo Pärt conduzida pelo violinista letão Gidon Kremer com a Kremeralta Baltica. Link do YouTube: https://youtu.be/4zmNDn-bhyQ
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