René Magritte – He is not speaking |
Nas últimas duas semanas tenho sido um pouco mais incisivo em minhas postagens no stories do Instagram. Meu alvo tem sido, em especial, as fotos de antes e depois e as propagandas enganosas que alguns “profissionais” têm postado.
Vou contar para vocês uma história antiga. Quando comecei a trabalhar com cabelos, há quase 20 anos, erta muito comum encontrar pacientes que chegavam para passar em consulta desconfiados. A grande maioria tinha tido experiências ruins (entendam ruins como sem sucesso), com produtos ou profissionais que vendiam, entre outras coisas, resultados impossíveis de se alcançar. “Esse pessoal que mexe com cabelo é tudo picareta”, diziam eles. Ou seja, o mercado estava nas mãos de quem praticava algo que não era científico, prometia resultados que não poderia alcançar e acabou ficando mal falado.
O que tenho visto hoje no Instagram (saí do Facebook porque, apesar de ser uma rede mais populosa, o Facebook tinha muita postagem de “oncinha pintada, zebrinha listrada e coelhinho peludo”, faço aqui minha homenagem à velha guarda da banda Titãs, e isso me incomodava), é algo que me lembra muito meu começo de carreira. Gente postando resultados de antes e depois sem padronização de luz, de posição de foto, de penteado. Gente postando resultados maravilhosos em tempo recorde. E, como sempre digo, posts apenas de resultados excelentes. Nenhum resultado moderado ou fracasso (besta eu não, esperar que as pessoas postem fracassos nas redes sociais, não são sinceras nem em postar sobre o próprio humor, quem dirá postar fracassos profissionais).
Nestes 20 anos aprendi muitas coisas importantes sobre tratamentos capilares. Aprendo dia a dia. Mas há 4 delas que gostaria de dividir com vocês neste texto e que para mim pesam muito.
1- Uma Porsche 911 Turbo S 2017 precisa apenas de 2.9 segundos para sair de 0 e atingir 100km/h. Rápido não é? Sim, demais. Mas foi desenvolvida para isso. Um Fiat Mobi ano 2017 leva 16.6 segundos para atingir a mesma velocidade. Ou seja, um Mobi tem uma aceleração de 0 a 100km/h 5.7 vezes mais lenta que a Porsche. Os dois são carros, ou seja, executam uma função básica: transporte. Usam o mesmo tipo de combustível. Levam ao menos dois passageiros com um conforto razoável. Porém, são incomparáveis no que diz respeito à proposta que vai além do “transporte”.
Até agora você pode não estar entendendo onde quero chegar com esse argumento, mas vou explicar. Escolha qualquer um dos médicos que citarei aqui, todos eles referências mundiais em tratamentos capilares. Trabalham em grandes instituições, ocupam ou já ocuparam posições importantes em Universidades mundo afora, pesquisam, publicam artigos científicos, trabalham com o que há de mais atual, moderno, sofisticado, ou seja, com os métodos mais eficientes para recuperação capilar. Métodos que a grande maioria de nós, mortais comuns, não utiliza. São profissionais que, com todo o conhecimento e aparato que têm disponível, poderiam fazer um tratamento capilar evoluir na velocidade de uma Porsche enquanto os nossos evoluem na velocidade de um Fiat Mobi. Peguem alguns antes e depois postados no Instagram (desses que parecem mágica) e mostrem para eles. Digam que os resultados foram atingidos em menos de 3 meses e fiquem olhando a cara que eles vão fazer. Ou vão dar risada, ou vão fazer cara de desconfiança, ou vão dizer que a foto foi photoshopada. Ou seja, não dá para acreditar que o que o pessoal tem postado de antes e depois nas redes sociais é sério.
Ah! Ia me esquecendo do nome dos médicos: Elise Olsen, Maria Hordinski, Jerry Shapiro, Rodney Sinclair, Ralf Trüeb, Valerie Randall, só para citar alguns.
2- Descobri, com os anos (não foi de um dia para outro), que alguns casos têm mais viabilidade para melhora do que outros. Tenho aprendido (leiam de novo o que acabei de escrever: TENHO APRENDIDO, porque não sei tudo e aprendo mais a cada dia), que essa viabilidade pode ser percebida no exame físico e tricoscópico. Um olhar treinado percebe quando um paciente tem mais potencial que outro.
Bem, do parágrafo acima, quero que guardem a ultima frase. Há pacientes que tem potencial de melhora maior que outros. Mas isso é algo que não significa nada se esse paciente, cheio de potencial de melhora não faz o tratamenbto direito, entendem? Voltando ao comparativo automotivo, é como ter uma Porsche e não explorar toda a potência de motor que ela oferece.
3- Desculpem a sinceridade, mas para mim quem precisa postar foto de antes e depois em rede social é porque precisa desenvolver mais curriculum e experiência para entender que vale mais uma boa construção de carreira do que postagens esporádicas de um sucesso aqui e outro acolá. Como já disse, desconheço pessoas que postam resultados meia boca ou ruins. Porém, duvido que aqueles que postam não tenham resultados insatisfatórios. Promover apenas o sucesso em meio de um elevado percentual de fracasso é corromper a estatística de resultados. Fazer publicidade disso é induzir o cliente ao erro para obter um benefício próprio. Ainda tenho dúvida se isso não é uma forma de propaganda enganosa.
Por fim, se a pessoa que posta for da área médica ainda está infringindo uma regra do Conselho Federal de Medicina que não autoriza o médico a postar fotos de antes e depois.
4- Para finalizar, me sinto um peixe fora da água. Querendo sanear um mercado que nasceu com “picaretas” e que insiste em ser povoado por eles. Como vamos deixar o mercado capilar mais sério se aqueles que estão envolvidos com ele não colaboram?
Seguirei investindo energia nisso, em analisar os riscos das publicações (postagens) e orientar quanto aos problemas que estão por trás deles. Espero que meu trabalho sirva para alguma coisa. Sei que muita gente vai torcer o nariz para mim. Não quero ser unanimidade. Quero ser alguém que levantou uma bandeira boa. Uma bandeira que defende não apenas uma classe de profissionais, mas, em especial, os pacientes e clientes que sofrem com a queda capilar.
Em alguns momentos, como fiz aqui nesse texto, escreverei de forma mais centrada. Em outros, me permitirei ser tomado pela emoção e fazer críticas mais”ásperas” (como me disseram esses dias), ou ironias. Como meu propósito tem um fim positivo, o que valerá é o resultado que as pessoas que procuram tratamentos sérios irão encontrar. Profissionais dedicados, idôneos e que valorizam muito mais a sinceridade e a atuação colaborativa com seus pacientes / clientes, do que a indução ao erro, a promessa impossível de ser atingida e a frustração.