O uso de produtos químicos para alisamento capilar tem sido amplamente popularizado nas últimas décadas, especialmente com a promessa de alternativas “mais seguras” ao formaldeído. No entanto, um recente estudo publicado no New England Journal of Medicine levanta sérias preocupações sobre a segurança desses produtos. O artigo descreve um caso alarmante de uma mulher jovem que apresentou três episódios de lesão renal aguda após a aplicação de um creme alisante contendo 10% de ácido glicoxílico, sem outros componentes suspeitos. Os pesquisadores sugerem que o ácido glicoxílico pode ser absorvido pela pele e metabolizado no fígado, convertendo-se em oxalato, o que pode resultar em nefropatia por oxalato de cálcio.
A paciente desenvolveu sintomas graves, incluindo vômitos, diarreia, febre e dor lombar, logo após os procedimentos de alisamento. Exames laboratoriais revelaram um aumento significativo nos níveis de creatinina plasmática, indicando comprometimento renal. O mais preocupante é que, em cada episódio, os sintomas surgiram imediatamente após a aplicação do alisante, sugerindo uma relação direta entre o produto e o dano renal. Embora a paciente tenha se recuperado após cada crise, o risco de progressão para uma doença renal crônica ainda é desconhecido.
Para entender melhor essa possível toxicidade, os pesquisadores conduziram experimentos em camundongos, aplicando o creme alisante na pele dos animais. Os resultados foram alarmantes: os camundongos expostos apresentaram cristais de oxalato de cálcio nos rins, semelhantes aos observados em intoxicações por etilenoglicol. Além disso, exames de imagem mostraram depósitos densos de cálcio nos túbulos renais, indicando um risco real de nefropatia induzida por esse composto.
O estudo levanta um alerta importante para a comunidade médica e para os consumidores. Embora o ácido glicoxílico tenha sido promovido como uma alternativa segura ao formaldeído, essa nova evidência sugere que seu impacto na saúde pode ser ainda mais grave do que se imaginava. Diante disso, os autores recomendam que produtos contendo ácido glicoxílico sejam evitados e até mesmo removidos do mercado, considerando seu potencial risco para a função renal.
Essas descobertas reforçam a necessidade urgente de mais regulamentações e estudos sobre os efeitos a longo prazo dos produtos químicos utilizados em cosméticos capilares. Profissionais da área de tricologia e dermatologia devem estar atentos a esses novos achados, orientando seus pacientes sobre os riscos potenciais do uso contínuo desses produtos.
Referência:
Robert T, Tang E, Letavernier E, et al. Kidney Injury and Hair-Straightening Products Containing Glyoxylic Acid. N Engl J Med. 2024;390(12):1147-1149. doi:10.1056/NEJMc2400528.