Há pouco mais de um ano nós perdemos o controle. Perdemos o controle de muitas coisas, entre elas o de parte de nossas vidas. Perdemos o controle para um vírus idiota que nos fez crer que podemos ser menores do que ele mesmo. Perdemos parte da liberdade, perdemos nosso trabalho, nosso lazer, perdemos a possibilidade de ter a vida como ela sempre foi. Perdemos pessoas queridas e próximas, a maior perda que tivemos. Nós perdemos o controle.
Mas será que a ideia de controle é algo que realmente faz sentido? Será que o controle nos pertence?
Ao longo dos anos tenho tentado trabalhar com meus pacientes a ideia de que a queda capilar é um exemplo, entre tantos, que a natureza utiliza para nos mostrar que não temos realmente controle de tudo.
Do ponto de vista do que chamamos de normal, partimos do princípio que sempre perdemos alguma quantidade de cabelo diariamente. O ser humano raramente admite perder, que seja qualquer coisa, perder nos incomoda muito. Mas somos acostumados, ao longo de nossa vida, a aceitar alguma queda capilar e considerar isso normal.
Quedas capilares aumentadas costumam ter formas variadas de surgir, fatores desencadeantes diferentes e até mesmo maneiras diferentes de se manifestar. Na sua maioria, as quedas capilares são programadas. Seus desencadeantes estão semanas ou meses no passado e, ironicamente, não temos controle sobre a queda capilar porque h[á sempre uma janela entre o desencadeante e a queda em si. Afinal, o que poderíamos ter feito para evita-la se há tantas causas para as quedas capilares que nem nos damos conta e muitas delas atuaram em nosso passado?
Uma vez que ela surge, até mesmo os tratamentos que podemos realizar pouco adiantarão para dar fim a ela com a rapidez que gostamos de dar. Ou seja, não adianta espernear, gritar, chorar nem querer pressa. Não temos controle sobre quando a queda diminuir.
Mas parece que mesmo sendo avisados de que uma queda instalada exige que saibamos esperar que os cabelos programados para cair se esgotem (posso dizer que eu falo isso em quase 100% das consultas médicas) muita gente não compreende ou aceita isso. Ou quem sabe, nunca tenha sido explicado a elas sobre esta situação. Afinal, ser profissional de saúde e educador, ao mesmo tempo, não é para todo mundo. Ainda que ser um educador na área da saúde não signifique ser um professor de fato, mas sim um transmissor de informações preciosas durante a consulta. Falar sobre coisas que possam tornar mais claro aos pacientes questões vinculadas aos seus problemas de saúde.
Mas vamos voltar à questão do controle. Precisou surgir um vírus, que nos roubou o controle de tudo, para reforçar a nossa falsa ideia de controle. A queda capilar após a infecção pelo COVID-19, ou causada por todo este momento conturbado de pandemia tem sido um evento traumático na vida de muita gente. E quis o acaso que para os cabelos de nós todos também.
É isso, perdemos o controle de algo que nunca controlamos na verdade. Mas, e agora? Agora precisamos aprender a lidar com a nossa ansiedade, cuidar dos nossos hábitos, estabelecer novas rotinas e cuidados. Tratar os cabelos pode ser uma forma de aprendermos que precisamos viver de forma mais tranquila e mais saudável. E, de alguma forma, devemos aceitar e confiar que podemos melhorar nossas vidas.
Aprendi que os cabelos sempre foram grandes professores. Nos ensinam com dor e medo que devemos procurar ter uma vida melhor. Que devemos aprender a lidar com o mundo que nos cerca. E, naturalmente, que saibamos que eles, os cabelos, exigem nossos cuidados. Cuidados que começam com a nossa integridade física e emocional e que devem seguir com uma atenção especial às necessidades dos nossos couros cabeludos e das madeixas especificamente.