Quem conhece minha formação sabe o quanto estudei psicologia nestes últimos anos. Senti essa necessidade quando percebi que a formação médica não era suficiente para dar conta das angústias pelas quais meus pacientes passam na medida em que perdem cabelos. Homens e mulheres, em graus diferentes, vivem a tensão intensa que a perda capilar provoca. Suas companhias constante é a incerteza sobre seus futuros, o medo de ficar careca.
Posso falar sobre isso com propriedade de alguém que viveu esta experiência na pele. Apesar de, como profissional, atuar há mais de 20 anos em cuidados com os cabelos, foi essa dolorosa experiência que me aproximou da área que eu escolhi para trabalhar. Comecei a perder cabelos aos 16, mas o medo de ficar careca estava me cercando há tempos. Para todos os lados em que olhava via calvos em minha família. Decidi que não ia ficar calvo e meus pais foram muito solícitos com esta decisão. Fui levado a médicos clínicos e cirurgiões. Fiz muitos dos tratamentos à disposição na época (faço até hoje) e acabei me aproximando muito do assunto no último ano de minha faculdade.
Há alguns anos, quando estudei a obra de Carl Gustav Jung, médico suíço e pai da psicologia analítica, descobri que eu começava a tomar a trilha de um curador ferido. Esse conceito, o do curador ferido, define o comportamento daquele que tem uma dor, um sofrimento, e usa o seu próprio sofrimento para desenvolver qualidades e habilidades para ajudar ao semelhante que vive a mesma dor. Como paciente e como médico escolhi tratar de queda capilar.
O estudo e a experiência me fizeram compreender muitos comportamentos de pacientes que perdem cabelos. Descrevi alguns deles em meu livro Como Vencer a Queda Capilar (CAECI Editorial), que está na segunda edição. Creio que hoje poderia definir outros tipos de comportamentos, uma vez que o livro foi publicado em 2012 e revisado para sua segunda edição em 2016. As formações em psicossomática, o estudo da psicologia analítica e meu mestrado em psicologia clínica pela PUC-SP me deram um substrato a mais para compreender a mim mesmo e aos meus pacientes.
Infelizmente, ainda não sei tudo. Isso é um desafio para minha carreira e um motor para que eu estude cada vez mais. Mas creio estar no caminho e espero que este caminho nunca acabe.
Porém, para encontrar este caminho tive que me fazer uma pergunta importantíssima. POR QUE TENHO MEDO DE FICAR CARECA? Não consegui resumir o conjunto de respostas que me veio à cabeça. Foram muitas. Respostas que eu dei a mim mesmo. Respostas que diziam respeito única e exclusivamente a minha rejeição a ficar calvo.
Após escrever em um pequeno caderno os motivos que me levam a ter medo de ficar careca, passei a procurar em meus pacientes, em suas falas, em nossas conversas, o que tínhamos em comum. Quais os sentimentos e as preocupações que compartilhávamos, que nos uniam. Naturalmente que esta identificação entre médico e paciente, paciente e médico, é algo que transforma a forma como eu trabalho. É como se cada pessoa que passa pela consulta carregasse consigo uma parte de uma dor minha. Ou, quem sabe, sou eu quem carrego algo da dor de cada um deles (pacientes).
E por isso luto tanto para ser um profissional melhor. Porque a cada dor que alivio em um paciente também alivio um pouco dessa dor em mim. Saber que um paciente tem seu cabelo melhorado é saber também que posso melhorar. Disso tudo, uma coisa é certa, há algo em comum entre eu e meus pacientes. Divido com eles o medo de ficar careca. E, ainda que possamos melhorar nossos cabelos, esse medo não nos abandona.